25/09/2011

de memória


no coração da árvore há um pardal molhado
tristíssimo
esperando em vão que o vento lhe soletre
só uma última vez
o nome das gotas tranquilas e longínquas
de março

entretanto
nasce um brilho azul vindo da planície matemática
da memória

e eu não consigo perceber por quem chamam
as violetas clássicas das gavetas
nem de que matéria é feita a solidão problemática
dos livros fechados
nem qual a razão para que as fivelas cúbicas e tardias da chuva
me encharquem de saudades anónimas e frias
e teimosamente repetidas
na geografia da noite

no coração daquela árvore há um pardal molhado
tristíssimo
esperando em vão que o vento
lhe soletre
só uma última vez
o nome de todas as sequências originais
do amor

entretanto
nasce um brilho azul vindo da planície matemática
da memória

e ao mesmo tempo
eu não consigo conquistar a simpatia complexa
do silêncio
nem catalogar as lágrimas utilizadas
pelo espírito

e não compreendo por quem chamam
os braços enfraquecidos das nuvens
agora que já não há
possibilidades de paisagem
 
entretanto
sento-me na coragem amarga
dos meus olhos que teimam
dirigir-se desprotegidos
a estas páginas
de tempo 
escrito em estrelas 
que já são gente

de memória
posso contar sempre com os mais
longínquos pedaços
do meu peito disperso

mesmo que

de memória
eu morra mil vezes cheio de vazios
em cada triste pestanejar
do poente.

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